quinta-feira, 27 de setembro de 2012

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Trecho de "O Padre e a Bruxa" de Natalia de Oliveira




     "Ethan despertou devagar, enquanto abria os olhos, ainda estava naquele momento entre o sonho e o despertar, tudo meio que em névoa. Estava deitado, nu, numa cama que não era a sua. Então sua visão foi entrando em foco e o que viu foi o rosto adormecido de Samantha que ainda dormia de frente á ele, seu cabelo ruivo espalhado pelo travesseiro e uma expressão de paz tão linda que Ethan sorriu. Sentiu o perfume dos cabelos dela e a lembrança do que havia acontecido lhe ocorreu em uma fração de segundos, aquecendo seu coração e mais uma vez sorriu. Naquele momento, não pensava em seus deveres, nas consequências, na igreja, se era errado ou não, em nada, tudo o que queria era que aquele momento durasse para sempre. Sempre havia se perguntado como seria estar apaixonado por uma pessoa á ponto de arriscar tudo por ela, agora sabia.

Olhou para a janela que ficava perto da cama, estava escuro lá fora. Por quanto tempo dormira? Já devia ser muito tarde, mas para a sua surpresa não se importava. Sentia-se feliz como nunca se sentira na vida e nada mudaria isso.

Ele se aproximou mais de Samantha e beijou de leve seus lábios. Ela se mexeu um pouco, mas não acordou.

- Eu te amo. – ele sussurrou acariciando seu rosto e ela pareceu sorrir. Era verdade, naquele momento, oque Ethan sentiu pela primeira vez foi amor.

Ethan ouviu um barulho lá fora, como de farfalhar de folhas secas no chão. Ele virou-se em direção á porta por um instante intrigado, mas como o barulho não continuou ele voltou á sua posição inicial de frente para Samantha, ignorando o perigo que se anunciava. Demorou alguns minutos até que outra vez ouvisse o barulho, dessa vez mais perto da casa. Dava a impressão de que eram passos, não de uma, mas de varias pessoas. O som parecia rodear a casa, lentamente, como se estivessem tomando cuidado para não serem percebidos. Ethan intrigado colocou-se sentado e passou á prestar atenção e ficou olhando para a janela, quase soltando uma exclamação de susto ao ver um vulto passar por ela. Sentiu uma sensação terrível nesse momento, de que algo estava terrivelmente errado. O que estava acontecendo? Ele estendeu a mão para acordar Samantha, mas isso não foi preciso, pois nesse momento, a porta da cabana abriu-se com um estrondo, acordando Samantha com um pulo. Ella abraçou Ethan por trás, para também esconder sua nudez. Um homem grande, de jeans, boné e camisa de flanela entrou, ele havia aberto a porta no chute! Mais cinco homens entraram, todos no mesmo estilo grande e mal encarado, caipiras valentões, digamos assim. Não os conhecia, mas podia jurar que já os tinha visto nas “rodas de orações” de Annabeth, e agora eles estavam invadindo a cabana.

- Ele está com a bruxa! – um deles disse com uma voz vacilante, como se ele tivesse tomado um litro de energético Red Bull – Pega ele!

- Quem são vocês?! – Ethan protestou ao ver essa invasão. Como resposta, levou um tapa na cara.

Dois dos homens pegaram Ethan pelos braços, arrastando-o para fora da cama e da casa, como se ele fosse um animal, pouco se importando com o fato de que ele estava nu.

- Não! – ele protestou, tentando desvencilhar-se, debatendo-se como um gato, mas eles eram maiores e mais fortes. – Me solta! – ele continuava. – Samantha! – ele gritou, pois estava temendo oque aqueles homens pudessem fazer com ela, mas Samantha veio logo atrás, sendo arrastada do mesmo modo gentil por dois daqueles homens, estranhamente, um deles ainda ficou na cabana, aquele que havia arrombado a porta.

- Por favor! – Samantha gritava, chorava, eles a arrastavam pelos cabelos, e também não se importaram que ela também estivesse nua. – Não! – eles a jogaram no chão. Ethan podia ver seu olhar aterrorizado.

Os fanáticos os arrastaram até o gramado do lado de fora da cabana, onde muito mais gente esperava. Toda a congregação de Annabeth, aqueles fanáticos estavam ali, eram dezenas, com tochas, como um levante medieval, um comitê de linchamento.

- Não toquem nela! – ele gritou.

Os fanáticos que seguravam Ethan fizeram com que ele se ajoelhasse e começaram a investir socos contra sua face, e no terceiro soco, quando caiu ao chão, começaram á chutar seu estomago de forma violenta.

- Parem, meus irmãos. – ele ouviu uma voz calma dizer atrás dos agressores e eles realmente pararam. Era a voz de Annabeth que havia se aproximado enquanto os brutamontes espancavam Ethan. – Ele é inocente, foi corrompido pela bruxa.

Os agressores o levantaram para que ele olhasse para Annabeth. Ela estava com os cabelos um tanto emaranhados, seus olhos estavam arregalados e as pupilas dilatadas. Seu conjunto de linho lilás não combinava com a bolsa de couro marrom que trazia apertada embaixo do braço como se a bolsa fosse fugir dela. Finalmente havia acontecido, Ethan pensou, a loucura finalmente havia tomado conta de Annabeth. Não havia nenhum ser racional ali.

O homem que havia ficado na casa voltara agora, trazia duas peças de roupa, uma camisola branca de algodão que ele jogou na cara de Samantha que tremia compulsivamente e a calça jeans que Ethan usara aquela tarde, que por sua vez também foi jogada em sua cara.

- Cubram sua vergonha, pecadores. – Ela disse dando uns passos para trás.

Samantha olhou desesperada para Ethan. Ele retribuiu o olhar como que dissesse “Faça oque eles mandarem, eles são loucos, droga!”. Ambos se vestiram com as peças trazidas, no entanto continuavam sob o domínio dos agressores que os seguravam. O rosto de Ethan doía, bem como sua barriga e suas costas e manter-se ajoelhado era difícil.

- Aproveitou bem seus momentos de devassidão, padre? – Annabeth disse aproximando-se agora que eles não mostravam mais suas “vergonhas”.

- Você é louca! – ele disse com ódio.

- Louca? – ela fez uma cara de ironia. –Você dá as costas á Igreja para fornicar com aquela cadela e nós somos os loucos? - uma enxurrada de “Améns” se seguiram á essa frase. – Mas eu entendo, você foi corrompido, todos nós fomos, com palavras doces e olhos de serpente. – ela se aproximou dele e acariciou seu rosto, como faria com uma criança. – O momento da expiação chegou, e eu aposto que vocês não estavam esperando por isso.

- Se encostar em um fio de cabelo dela eu juro por Deus que. . .

- Oque? Jura o que? – ela riu – Você caiu em desgraça aos olhos Dele, Padre. – ela se virou para a multidão dizendo em alto e bom som – Estão vendo, meus irmãos, oque aquela maligna criatura fez?! – ela apontava para Ethan – Esse não era um rapaz qualquer, era um servo de Deus, puro, e ela o escolheu, ela o desvirtuou. Olhem para ele, – ela apontava – a arrogância e a luxuria o tornaram cego. Mas a culpa é dele?

- Não! – a multidão disse em coro.

- De quem é a culpa então, meus irmãos?

- É da bruxa! – responderam mais alto, levantando as tochas.

- Nós podemos deixar que essa cadela continue com o trabalho do Inimigo, que continue á nos afastar do caminho do Senhor?!

- Não!

- Não, não podemos. – Annabeth disse baixo.

Ela se aproximou de Ethan outra vez, com aquele olhar louco que ela tinha.

- Pelo menos nisso você foi muito útil, Padre O’connel. – ela abriu a bolsa que trazia apertada junto ao corpo e de lá tirou um livro. De começo, Ethan achou que fosse uma bíblia, mas percebeu que já tinha visto aquela capa antes.

- Meu Deus, não. . . – ele murmurou.

Ela levantou o livro alto e os detalhes em dourado na capa de couro cintilaram com as luzes das tochas e ouve uma ovação por parte da multidão. Era o “Martelo das bruxas”, o livro errado nas mãos erradas. Isso não podia estar acontecendo, como ela conseguiu o livro? Ele estava trancado em sua gaveta.

- Esse livro, irmãos, abriu os meus olhos.– ela disse com um sorriso macabro. – Obrigada, Padre, por ele. Ethan olhou para Samantha que o olhava com verdadeiro desespero. – Que tal começarmos com o básico? Amordacem-na e joguem-na no rio, se ela boiar, veremos o que faremos.

- Não! – Ethan gritou

Nesse momento, ele sentiu uma dor forte na parte de trás da cabeça, uma pancada, então caiu no chão e desmaiou. . ."

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

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"Negocios são negocios" por Natalia de Oliveira


Negócios são Negócios
 


     - Põe mais uma dose aqui! – Nathan disse para Russ depois de secar o quinto copo de whisky.

     - Cara, você não acha que já está bom por hoje?- Russ, o barman disse com tom ameno enquanto secava um copo com um pano de prato branquíssimo.

     - Eu to dizendo para encher a porra desse copo. – Nathan disse ríspido.

     Russ olhou com pena para Nathan, seu amigo (freguês) de longa data. O rapaz não tinha mais do que vinte e cinco anos de idade, mas parecia mais, por causa de seu cabelo que exibia já alguns fios brancos, suas olheiras crescentes e sua feição cansada, de quem levou uma surra da vida.

     Nathan não tinha uma vida boa, isso até Russ podia ver e frequentava o Russel’s Bar á um bom tempo, fazendo de lá seu confessionário. Nathan era um bom homem, mas as coisas teimavam em dar errado em sua vida. Fora expulso de casa por seu pai quando era ainda adolescente por ter se metido com amizades erradas. Comeu o pão que o diabo amassou e conheceu Mariene uma das únicas coisas boas que já havia acontecido com ele e se casaram. Um tempinho depois, ele chegou em casa mais cedo e a encontrou com o zelador porto-riquenho do prédio. Ele não disse nada, apenas fechou a porta, saiu do prédio e foi até o Russel’s e entornou sozinho uma garrafa de whisky, quando chegou, ela disse que era culpa dele por ser tão distante e inútil e que queria o divorcio. Como estavam casados á um bom tempo, ela tinha direito á metade de tudo que era dele. Por consequência bebera ainda mais e seu chefe estava prestes á demiti-lo por chegar quase todos os dias bêbado. É, isso que era classe.

     Russ olhou para Nathan e pegou a garrafa de Jack Daniels.

     - Olha, cara, eu vou colocar mais uma pra você mas depois disso você vai para casa. Já passou da hora de fechar, se você não reparou só tem você e eu aqui. Você vai para casa, vai dormir, vai tomar vergonha nessa cara e dar a volta por cima.

     Russ encheu o copo com aquele abençoado liquido dourado com uma expressão muito reprovadora.

     - Assim, você não vai cativar seu clientes.

     Nesse momento eles ouviram o telefone tocando lá longe, no escritório. Russ olhou para trás e olhou para Nathan.

     - Eu vou atender o telefone e quando eu voltar eu vou fechar o bar, está me entendendo?

     - Como você é chato.

     - Cara, quando você fica bêbado, você fica intragável.

     Russ balançou a cabeça, guardou a bebida em baixo do balcão e sumiu por uma porta que ficava atrás do balcão. Nathan ficou sozinho com seu copo de alegria no silencio do bar vazio. Por que as coisas eram assim? Por que tudo dava errado para ele? Imaginava se havia caído da arvore do azar e batera em todos o galhos no caminho. Sua vida era uma droga e essa era a única verdade que conhecia.

     - É uma verdade, mesmo. – uma voz soou atrás dele, grave, fazendo-o se virar.

     Olhou para o bar e viu num canto, havia um homem em uma mesa, na penumbra. Estava muito quieto e ele teria passado totalmente desapercebido se ele não tivesse falado, tanto que Russ achou que só estavam ele e Nathan no bar.

     - O que? – Nathan disse forçando a vista para poder ver melhor o homem.

     Ele ficou em silencio, então ele se levantou e veio caminhando na direção do balcão, onde estava Nathan. O homem era alto e com boa aparência, se vestia muito bem, com um terno que Nathan teve certeza que era mais caro do que todas essas biritas juntas. Era muito bonito e tinha uma expressão serena. Ele se aproximou e se sentou ao lado de Nathan.

     - Dia difícil? – ele disse com sua voz macia. Seus olhos eram faiscantes, mas Nathan não conseguiu identificar a cor.

     - Parece? – Nathan bebeu um gole da bebida.

     - Quem nunca passou por isso, não é?

     - Eu te ofereceria uma bebida, mas. . .

     - O que é isso, faço questão.

     Do nada, apareceu na mão do homem, uma garrafa de vidro estranha, não fazia parte do acervo de Russ e parecia velha e o estranho homem completou o copo de Nathan. Bem, ele estava bêbado, mas ele percebeu que isso foi para lá de estranho.

     - Obrigado. – ele disse ressabiado.

     Nathan sorveu um gole do liquido que lhe desceu queimando mais do que o normal. O homem riu e com o rabo de olho ele viu que os dentes dele eram um tanto pontudos.

     - Mas o que é isso?

     - Uma coisinha da minha terra. – ele sorriu e fez uma pausa – Para beber desse jeito, você deve estar com algum problema.

     - Você sempre chega assim nas pessoas?

     - Só quando elas precisam de mim.

     - E eu preciso?

     - Todo mundo precisa, mais cedo ou mais tarde. – ele disse com um sorriso compreensivo.

     - Qual o seu nome? – Nathan disse ressabiado.

     - Eu tenho vários, mas meu nome, Nathan, não é importante. O importante, - ele tornou a encher o copo de Nathan que só então reparava que não tinha dito qual era seu nome. – é que estamos tendo uma ótima conversa. Agora, me diga o que aflige seu coraçãozinho?

     Nathan achou aquilo estranho, mas a voz daquele homem era tão convidativa, que quando percebeu estava fazendo uma dissertação sobre a sua vida, que pareceu durar horas. Contou tudo sobre sua vida miserável, a esposa infiel, o chefe marosco e como tudo dava errado em sua vida.

     - Mas então, diga-me, o que você quer? – o homem disse.

     - Que as coisas fossem diferentes, ué. – disse em tom irônico. – Que eu acordasse um dia e tudo estivesse diferente, que a vagabunda da minha esposa não me causasse mais problemas, que meu chefe não me perturbasse mais e que eu não tivesse que me preocupar se vou ter um lugar para morar amanha. Daria qualquer coisa por isso.

     - Feito.

     - O que? – nesse momento o copo que estava em sua mão se quebrou em lascas, fazendo um corte em sua mão.

     - Droga!

     - Permita-me.

     O homem tirou um pedaço de pano de linho de dentro do bolso e colocou sobre o corte somente, tirando logo em seguida.

     Ele se levantou e colocou o pedaço de pano de volta no bolso.

     - Mas. . .

     - Agora me vou, foi um prazer fazer negócios com você.

     - Mas que negócios? – ele disse mais interessado em pegar um guardanapo que estava ali no balcão para estancar o sangue que saia de sua mão.

     Quando ele virou-se outra vez, o homem não estava mais lá e não ouvira o som da porta se abrir. Olhou para o bar e uma sensação horrível lhe passou, um frio na espinha, uma sensação horrorosa.

     - Tudo bem? – Nathan ouviu a voz de Russ atrás de si e deu um pulo com o susto.

     - Russ, onde você estava? Você viu aquela cara? Ficamos conversando por horas.

     - Do que esta falando? Só sai por um minuto. E que cara? Não tem ninguém aqui. – disse com um tom intrigado.

     - Mas. . . – ele tentou dizer mas estava tão confuso quanto poderia estar.

     - Você está bêbado, isso sim, vai para casa. Ele disse por fim.

     Sem dizer mais nada, Nathan saiu do bar e voltou para casa com um sensação estranha no estomago, com se algo muito errado tivesse acontecido, só não sabia o que. Ele voltou para casa e dormiu no sofá como fazia desde o dia que pegava a esposa com o zelador. Teve um sonho muito estranho com aquele homem do bar, onde tudo o que via eram os dentes e os olhos faiscantes.

     Acordou na manhã seguinte com uma dor de cabeça muito forte, tanto que não abriu os olhos de começo. Esperou alguns minutos e abriu os olhos relutantemente. Colocou-se sentado e ia esfregar os olhos, mas deteve-se pois viu que sua mão estava vermelha, não vermelha, empapada de sangue. Olhou para a outra mão, também estava cheia de sangue. Levantou-se de um pulo e viu que sua camisa e sua calça de dormir também estavam cheias de sangue. Apalpou-se á procura de algum ferimento e não encontrou nada.

     - Ah, meu Deus!

     Afastou-se e olhou para o chão, havia uma trilha de sangue que levava até o sofá. Com o coração aos pulos foi seguindo a trilha de sangue e percebeu que ela vinha da escada lá de cima.

     - Não, por favor não. – ele tremia enquanto subia a escada.

     Lentamente ele foi seguindo a trilha de sangue e com uma dor no peito viu que a trilha vinha do quarto de Mariene. Ele abriu a porta e olhou lá dentro e caiu de joelhos desesperado. Mariene estava deitada na cama, havia sangue por toda parte, ela fora atacada no meio da noite e a faca ainda estava lá jogada no meio do quarto.

     Ele se aproximou da esposa, ela estava nua na cama, com os braços amarrados na cabeceira, o corpo estava todo perfurado, estava morta, bem morta.

     - Você não pode morrer agora, não pode! – ele pulou na cama e começou a tentar a desatar os nos que prendiam os braços de Mariene, mas não conseguia. Nesse momento ele ouviu o som de sirenes de policia se aproximando. Mas que droga!

     Os policiais que o encontraram disseram que ele estava totalmente descontrolado, banhado em sangue e não dizia coisa com coisa. Fora preso e acusado do assassinato de Mariene, pois a faca tinha suas digitais, ele estava na cena do crime e o pior, ele tinha motivo.

     Ele não se lembrava do que acontecera, estava bêbado demais para se lembrar, mas uma coisa sabia, ele não tinha feito aquilo. Por mais que odiasse Mariene, não teria coragem para mata-la, se o tivesse, teria matado ela no dia em que flagrara a traição, tentara argumentar isso, mas só piorara as coisas.

     Alguns dias depois, um guarda foi á sua cela, alguns dias antes do julgamento. Nathan estava deitado olhando para o teto.

     - Ai, estripador, tem visita pra você.

     Ele se levantou e seguiu o guarda através dos corredores da delegacia até a sala de visitas e quando entrou não tinha ninguém lá dentro.

     - Ei, não tem ninguém aqui. – disse para o guarda que não lhe deu atenção e fechou a porta, trancando-o. Ele caminhou pela sala estranhando tudo isso. Passou pela mesa comprida e voltou até a porta para chamar o guarda quando ouviu algo.

     - E então, as coisas estão diferentes? – ouviu uma voz familiar e virou-se.

     Sentado numa das cadeiras da mesa, estava aquele homem do bar. Ele deu um pulo e se bateu na parede com o susto.

     - O que você tá fazendo aqui? – disse exasperado.

     - Eu vim te ver.

     - Guarda! Me tira daqui! – ele gritou se batendo na porta.

     - Que falta de educação. Eu faço o que me pediu e não recebo nem um obrigado.

     Ele parou e virou-se, ele estava ofegante.

     - Foi você? – disse por entre dentes e por resposta recebeu um sorrisinho.

     - Ela gritou um pouco, muito, - ele riu. – Devia ter visto a sua cara enquanto você esfaqueava ela, quantas vezes? Trinta?

     - Eu não fiz aquilo!

     - Ah, fez sim. Tudo o que eu fiz foi insuflar um pouco de coragem e criatividade nessa sua cabeça.

     - Quem é você?

     - Vai me dizer que você não sabe? – ele disse exibindo um sorriso odioso.

     Nathan caiu de joelhos encolhido no canto tremendo.

     - Isso não é verdade, isso não é verdade.

     O homem levantou-se e veio caminhando em sua direção com passos lentos.

     - Lembra do que você disse aquela noite?  - ele então imitou a voz de Nathan, não era parecida era a voz de Nathan – “Que as coisas fossem diferentes, ué”. – disse em tom irônico. – “Que eu acordasse um dia e tudo estivesse diferente, que a vagabunda da minha esposa não me causasse mais problemas, que meu chefe não me perturbasse mais e que eu não tivesse que me preocupar se vou ter um lugar para morar amanha. Daria qualquer coisa por isso.”

     - Eu não. . .

     - Fizemos um trato, lembra? – do bolso, ele tirou o pedaço de pano de linho o jogou na cara de Nathan que o pegou com nojo e o leu com desespero o conteúdo que estava escrito em uma caligrafia finíssima.

     Era um contrato, realmente, dizendo que em troca dos serviços do Diabo, ele ficaria com sua alma. Isso mesmo, com a alma, um contrato muito bem elaborado alias, com uma mancha de sangue no espaço da assinatura. O mesmo pano de linho com o qual ele limpara sua mão cortada.

     - Você é o Diabo?! – ele exclamou.

     - Que nome antiquado! – ele meneou a cabeça.

     - A minha alma. . . você quer a minha alma?

     - Como você pode ver no contrato, é isso mesmo.

     - Você trapaceou! – Nathan esbravejou.

     - Negócios são negócios. – ele sorriu. – O mundo gira em torno das oportunidades, você vê uma e agarra.

     - Meu Deus!

     - O nome não é exatamente esse.

     - Você matou a minha esposa.

     - Era isso o que você queria.

     - Não era, você distorceu minha palavras.

     - Eu não tenho culpa que você não especificou exatamente o que você queria. Mas veja por esse lado, na atual situação, você não tem mais a vagabunda, nem chefe, e nem vai mais se preocupar se vai ter uma casa amanha.

     - Seu desgraçado!

     - Tenha uma boa, vida. Daqui alguns meses virei buscar o que me pertence, sabe, os advogados serão osso duro no seu julgamento.

     Ele sumiu esvanecendo-se no ar. Nathan começou a gritar como um louco e a se bater na porta. Os guardas chegaram e foram necessários cinco deles para controla-lo. Nathan foi internado na ala psiquiátrica da penitenciaria, esperando o dia do julgamento, no qual seria pedida a pena de morte.




terça-feira, 25 de setembro de 2012

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Prêmio "Clube de autores" de literatura conteporânea

    Olá, leitores!!
    Dentre todas as carreiras existentes, a de escritor é das mais - senão a mais - difícil. Um escritor iniciante precisa conciliar uma árdua vida cotidiana com o ânimo e a inspiração para criar histórias envolventes, profundas e que despem a sua alma para leitores anônimos.
Escrever é se entregar de uma maneira plena. É registrar, em cada palavra, linha e parágrafo, um pouco de sua alma e de suas crenças mais profundas.
E- claro - ter um público leitor faz parte dos ideais de todo escritor.
O Clube de Autores nasceu, oficialmente, no dia 15 de maio de 2009 - tendo pouco mais de três anos de vida. Neste período, a proposta foi simples: dar a escritores de todo o Brasil a possibilidade de publicar as suas obras sem precisar pagar nada por isso. O resultado não para de superar nossas expectativas: já foram mais de 12 mil obras publicadas e centenas de milhares de exemplares vendidos neste curto espaço de tempo.
E, com esses resultados - a cada venda e a cada contato com autores - surgiram novas demandas.
Uma das principais delas está sendo repetida com este Prêmio, que já é um dos eventos que marcam o calendário da literatura independente nacional.
Do total de inscritos, haverá apenas 1 vencedor e 10 finalistas - sendo que estes exibirão em suas páginas de livros selos que, naturalmente, aumentarão a reputação dos mesmos. Com maior reputação e reconhecimento, mais vendas tendem a ocorrer - e a consolidação da carreira literária fica mais próxima.
Este é o conceito do Prêmio - que tem como premissas ser absolutamente gratuito e aberto a todos os autores do Clube que acreditam que as suas obras são retratos fiéis dos seus valores mais caros e profundos.

O meu livro "Sebastian" é um dos livros concorrentes á esse prêmio e peço á  vocês, queridos leitores, que deem seu voto não á mim, mas á minha obra. Há alguns capitulos disponiveis dela aqui no blog e tenho certeza de que emocionou vocês. Esse é o link,  http://premio.clubedeautores.com.br/web/site_premio/votar.php?id=130919
Sei que com a ajuda de vocês, tudo pode ser possivel!!!!
Beijoss!!!!!!!!!!!!!
                                                                                                                Natalia de Oliveira
                                                                                                                criadora do blog

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

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"Sebastian" , capitulo III , por Natalia de Oliveira

Parte I
Capitulo III
"Renascimento"

       Seu presente de boas vindas foram duas costelas quebradas, hematomas e escoriações pelo corpo todo. Apanhara como um condenado. Don Giovanni tinha razão, durante toda a sua vida jamais se esqueceria dessa surra. Não dormira naquela noite, desmaiara no chão daquele quarto por causa da dor e acordara na manhã seguinte quebrado, como nunca se sentira em sua vida. A cama estava intocada, ninguém dormira ali, Don Giovanni devia ter passado a noite fora.

       Vicenzo recebera ordens para chamar o garoto que vinha descendo as escadas com muita dificuldade e dor. Seu dono o esperava sentado no sofá da sala, usava óculos para esconder os olhos vermelhos e a olheiras provocadas por causa da bebedeira da noite anterior, em uma festa.

       - Vamos logo. – levantou-se, pondo-se a andar até a porta. Não estava tão gentil como na noite anterior, provavelmente devia estar de ressaca.

       Os dois deixaram o casarão a atravessaram o jardim que á luz da manhã revelava toda a sua beleza numa explosão de cores nas mais variadas flores. Como antes, sentaram-se um de frente para o outro na limusine.

       - Aonde vamos? – perguntou Chandler assim que o motorista deu a partida. – Espero que até aquele restaurante, eu estou morrendo de fome. – disse provocando.

       - Vamos ao seu trabalho. – respondeu seco.

       - Está de mau humor? – cinicamente fingia uma expressão preocupada.

       - Sim, eu estou, e é melhor não me encher o saco. Minha dor de cabeça já está forte o suficiente.

       Chandler riu por dentro, já que a dor o impedia de rir fisicamente.

       - Que bom. – disse para que Don Giovanni ouvisse e notou que ele o fuzilava com os olhos.

       - Só estou me dando ao trabalho de levar você porque depois de deixá-lo, vou direto para a minha casa em Roma. – estava irritado.

       - Pensei que sua casa fosse essa.

       - Não, é só uma delas, um lugar que fico quando venho á Nápoles. O ponto forte dos meus negócios fica em Roma. – ele riu de repente – eu nem sei por que estou discutindo negócios com você.

       - Talvez porque eu seja um de seus negócios. – disse áspero.

       Don Giovanni olhava fixamente para Chandler, ele era diferente dos outros, insolente, belo, olhava-o nos olhos, parecia indomável. Nem o “presentinho” de ontem o colocara em seu lugar. Ele parecia assustado quando chegara, mas agora era como se a surra houvesse despertado algo nele.

       O garoto também se sentia assim, quando acordou, viu tudo claramente. Estava no mundo de Dom Giovanni agora, e se quisesse sobreviver nele teria que ser forte e não demonstrar medo dele, coisa que o próprio Don Giovanni lhe aconselhava a fazer. Um pouco de provocação, não muito, só pra mostrar que não ia ser dobrado tão fácil assim.

       - Você vai para as ruas, meu querido. A sua missão é trazer dinheiro, o modo você escolhe, o importante é trazer. Você dá o dinheiro que conseguir ao seu superior, que por sua vez o dá a Vicenzo, que conhece muito bem. – riu – É simples, ou quer que eu explique de novo?

       - Eu sou um escravo? – perguntou mais para si mesmo, mas a resposta veio de seu dono.

       - Mais ou menos isso. – deu de ombros.

       - Serei seu pra sempre? – perguntou desconsolado.

       - A coisa funciona assim: você é meu até morrer, oque não é muito raro nas ruas, ou até que pague a divida que tem comigo.

       - Eu não te devo nada! – protestou indignado.

       - Eu comprei você, e foi bem caro, lembra? Foi um investimento do qual eu espero lucro.

       - Quando eu tiver pagado tudo, então, me deixará ir?

       - “Se", - ele frisou – se estiver vivo até lá. Mas pode subir de posição também, se quiser, com o tempo. – afirmou pensativo – Notei que é esperto, não abaixa a cabeça, tem potencial. Assim como eu. E ai, - riu – não vai querer partir.

       - Eu jamais serei como você.

       - Duvida?

       Essas palavras fizeram Chandler pensar. “Era possível gostar dessa vida de escravo?”.  Impossível! Era a pior coisa do mundo. Embora talvez demorasse a pagar. Porém Don Giovanni era a prova viva do que estava falando, fora um escravo, assim como era um agora. Um arrepio subiu por sua espinha, uma imagem horripilante passou por sua cabeça: ele, vestido como Don Giovanni, falando como ele agindo como ele. Temeu que no futuro pudesse ficar assim.

       Não demorou até que o carro parasse num Beco de Nápoles, que era na verdade a divisa entre um açougue e uma loja de artigos religiosos, em algum lugar da periferia da cidade.

       - Descemos aqui. – o motorista desceu do carro e abriu a porta para seu patrão descesse.

       O garoto, com muita dificuldade, desceu da limusine e deparou-se com um lugar feio. Havia um grupo de jovens mais á frente, quase no final do beco, eram seis, todos de aparência muito estranha, havia um tipo de sombra neles que não lhe agradava. E todos olhavam para ele, analisando o novo colega. Eram a s crianças de Don Giovanni.

       Caminharam pelo beco, indo em direção ao grupo. O homem conduzia Chandler como se estivesse mostrando uma obra de arte que acabara de arrebatar em um leilão.

       - Faz um bom tempo que não te vejo senhor. – um dos garotos se adiantou.

       Ele era loiro, olhos castanhos, usava uma roupa simples, mas boa, calça jeans e uma jaqueta jeans. Era arrogante, Chandler podia ver em seu jeito de andar e olhar. Fumava algo, oque, nem queria saber, seja lá o que fosse o cheiro era horrível. Do grupo sem duvida era o mais bonito, aparentava ter uns dezoito anos de idade e pelo jeito era o superior do grupo. Ele aproximou-se de Don Giovanni e para sua surpresa, eles se cumprimentaram com um longo beijo. O que espantou Chandler, nunca tinha visto dois homens se beijando.

       - Estive fora. – Don Giovanni disse afastando-se.

       - E trouxe um presente. – disse o loiro voltando sua atenção para Chandler com um sorriso malicioso. – Quem é essa gracinha?

       - Meu mais novo investimento. – sorria – Chandler.

       - Chandler? Que nome é esse?

       - É americano. – justificou.

       - E é tímido. – o loiro completou.

       O garoto se aproximou de Chandler e deu uma tragada no cigarro, analisando-o de cima a baixo. Então estendeu a mão.

       - Sou Francesco, prazer.

       - Não posso dizer o mesmo. – respondeu sem demora.

       - Ele já está entregue, cuidem bem dele garotos.

       Dom Giovanni girou nos calcanhares e saiu voltando apressado para a limusine, deixando o garoto sozinho com o grupo. Viu-se completamente abandonado. Francesco não tirava os olhos dele. Sentiu que o estava analisando, vendo se era bonito o suficiente, forte o suficiente para ser um deles. Isso além de incômodo era constrangedor, Francesco o rodeava, fumando aquela coisa horrível, já estava começando a fica enjoado com aquele cheiro.

       - Foi uma pena oque fizeram com você. – disse referindo-se aos hematomas em seu rosto. – Mas vai passar. Todos nós passamos por isso quando chegamos.

       - Isso deveria me consolar? – disse ríspido.

       - Soou como um consolo? – Francesco respondeu sarcástico.

       - Seu inglês é bom.

       - Aqui é a Europa, o mundo todo vem até nós. O inglês se tornou a língua universal. Você por outro lado, vai ter que aprender italiano, mas não se preocupe, nós te ensinamos.

       - Você é daqui?

       - Sou, mas como você, outros vieram de fora. – deu a volta e foi até onde seus amigos estavam – Deixe-me apresentá-lo á família: esse é Juan; veio da França, Marc, também da França; Vicente é daqui; - sorriu – e os gêmeos Luigi e Pietro, que são daqui mesmo. Garotos, esse é. . . – hesitou, aproximou-se de Chandler e disse ao pé do ouvido – Sabe, esse seu nome é muito exótico, para não falar estranho, todos nós somos discretos aqui, então vamos improvisar. – parou um pouco para pensar e disse em voz alta. – Esse é Sebastian, nosso mais novo amigo. - disse voltando-se para o garoto – Esqueça agora o seu passado. O que aconteceu antes não importa. Agora você renasceu.

       Chandler havia renascido sim, agora era Sebastian, e aquele era o primeiro dia do resto de sua vida. Não sabia ao certo explicar como se sentia, era como se estivesse num pesadelo, e por mais que tentasse, sabia que não acordaria. Ali naquele beco, teve noção do que havia acontecido com ele: era um garoto de rua, sujeito a todos os tipos de perigo que esta oferecia, humilhado, arrancado de sua terra, as palavras de Don Giovanni faziam sentido agora. O mundo era feio, diferente daquele que conhecia, não havia mais ninguém no mundo que ele amasse. O destino que se afirmava no horizonte nunca lhe parecera tão negro, e nessa perspectiva, Chandler Desmont não iria sobreviver.

       Mas iria sobreviver, iria arranjar coragem e manter-se vivo, não importasse quais as provações que a vida ainda lhe reservasse, tudo com um único e firme propósito: iria ficar vivo para que um dia, voltasse á América para acertar as contas com Robert Murphy, jurou para si mesmo que o destruiria, nem que isso fosse a última coisa que fizesse, nem que morresse tentando, iria vingar-se e a seu pai. Mas para isso teria que mudar, assim como seu nome fora mudado, teria que deixar de ser aquele garoto besta e ingênuo para se tornar Sebastian.

 

       As portas do escritório de Robert Murphy se abriram bruscamente, assustando-o por um momento, no entanto o que entrou por aquela porta não era nada assustador. Jake Piston, o delegado da cidade de Aaron River. Não mandava em nada, era tão significante quanto um peso de papel, mas parecia enfurecido. Era um homem de meia idade, já calvo, sua barriguinha saliente denunciava seus excessos. Usava uma calça marrom, uma camisa branca por baixo do paletó marrom. Tinha a gravata afrouxada e parecia que ia ter um ataque cardíaco ali mesmo.

       - O que faz aqui? – Robert Murphy desdenhava colocando de lado os papeis que analisava.

       - Se quiser brincar de incendiário, faça isso longe da minha jurisdição. – Jake dizia furioso.

       - Do que esta falando, homem? – usava o tom mais desinteressado que encontrou.

       - A oficina do Desmont!

       - Ah, aquilo foi um acidente, um infeliz acidente, pergunte a qualquer um, aquele lugar era muito velho. A fiação elétrica era um horror, e os produtos químicos que ele usava. . .

       - Será que é isso o que a perícia vai dizer? – Piston insinuava.

       - Vai, se você for esperto e tiver uma palavrinha com eles, como sempre. – parecia muito calmo.

       - Dessa vez não. – o nervosismo saltava aos olhos.

       - Como assim?

       - Se isso foi um acidente como diz, onde está o outro corpo? – dizia enigmático.

       - De quem? – disse cínico.

       - Deus do céu! – exclamou exasperado – Do garoto, do filho dele!

       Houve um silêncio mortal na sala.

       - Se bem me lembro, Delegado Piston, é seu dever saber, e eu não vejo razão para você estar me perguntando essas coisas.

       - Recebi uma ligação muito interessante hoje, de Washington. Isso virou uma investigação federal. Vão mandar alguém aqui para cutucar esse caso.

       O homem estava visivelmente abalado e pôs-se a andar de um lado para o outro do escritório.

       - Seu incompetente, como deixou isso vazar?!

       - Isso não importa o caso agora não é um simples acidente, uma criança está desaparecida. Eles vão querer exumar o corpo do Desmont, e não estranharei se encontrarem qualquer objeto metálico alojado nele. – parou para encará-lo.

       - O que está insinuando, seu verme?

       - Nada, só estou te avisando que não cobriu seus rastros direito, e por isso seu pescoço está perigando.

       - O meu não é o único, levando-se em conta que o delegado que alegou acidente foi você. Fique esperto e dê um jeito de contornar isso antes que os Federais comessem a bisbilhotar, caso contrário, uma cabeça vai rolar, e não será a minha. – Robert disse objetivo.

       Jake o olhava com verdadeiro desprezo e horror.

       - Diga-me pelo menos, que fim levou o garoto Desmont?

       - Quem é que sabe? – deu de ombros.

       - Mais uma coisa, diga aos seus macacos para fazerem seu trabalho direito, e me pouparem do trabalho de falsificar os boletins de ocorrência.

       - Diga você mesmo á eles. Eles vão á delegacia esta tarde, levar a minha contribuição até o senhor.

       O Delegado sentia-se humilhado cada vez que Murphy o lembrava de que não passava de um fantoche. Mas a ambição pelo dinheiro era maior que o amor próprio.

       - Até mais, Delegado Piston. – disse vendo que aquele inútil ainda continuava lá. – Mova-se!

       Essa frase bastou para que o Delegado deixasse o escritório como um furacão.

       - Estou cercado de incompetentes. – disse em voz alta para si mesmo.

       Mal o Delegado Piston saiu do escritório, April entrara mais furiosa do que jamais esteve. Os olhos azuis faiscando de raiva e uma expressão aborrecida que não combinava com seu rosto fino e delicado.

       - Será que eu vou ter que começar a trancar essa porta. – disse já irritado pela discussão com Piston. - Oque você quer?

       - Você é um monstro! – disse ela esbravejando.

       - Morda sua língua antes de falar comigo nesse tom! – se alterou, levantando-se de sua poltrona.

       - Pensa que eu não sei, que todo mundo não sabe?

       - O que uma fedelha como você poderia saber? – desdenhava dando a volta na mesa para se aproximar da filha.

       - É tão sujo oque fez com os Desmont, que me dá nojo.

       - Ah, é? – Robert aproximou-se de April que por sua vez hesitou e deu um passo para trás. – Está com medo de mim? Aonde foi parar toda aquela coragem com a qual entrou aqui?

       - No mesmo lugar onde foi parar sua vergonha.

       Num gesto rápido, Robert desferiu um tapa no rosto de sua filha. April ficara um tempo com o rosto virado, mais pelo choque de ter sido agredida pelo seu pai do que pelo impacto e quando voltou a fitá-lo, ele não demonstrava qualquer sinal de arrependimento, ou raiva, nada, seu rosto era impassível, imóvel, como se tivesse sido esculpido em pedra, sem qualquer emoção.

       - Olhe bem garota, vou dizer apenas uma vez: os Desmont sofreram um acidente terrível. O que quer que tenha escutado por aí, ou aqui, principalmente aqui, guarde para você. Entendeu?

       Boquiaberta com a frieza do pai, April o observava voltar calmamente para sua poltrona, do outro lado da grande mesa, como se nada tivesse acontecido. Derrotada por hora, April virou-se, caminhando para a porta do escritório, saindo de lá, rumo ao seu quarto no qual se trancou o resto do dia. Ficou triste sim, mas com uma certeza: ele iria ver quando o FBI chegasse.

 

sábado, 22 de setembro de 2012

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"Sebastian" , capitulo II , por Natalia de Oliveira

Parte I
Capitulo II
"O que não mata deixa forte"
 

       Chandler estava tendo um pesadelo terrível que na verdade começara como um sonho normal. Sonhava que andava calmamente por um vasto campo.  Andava, andava, e cada vez mais o campo parecia se transformar num deserto, um lugar árido, seco.  Então, lá na frente vira uma coisa, algo que não sabia o que era, mas que deveria se aproximar e ver. Conforme foi andando, viu que três corvos rodeavam a coisa, pulavam sobre ela e a beliscavam com seus bicos finos e vorazes.

       Não podia se controlar, tinha que ver o que era, aproximou-se o bastante e percebeu que se tratava de um cadáver.  Estava de bruços e os corvos já haviam comido boa parte de suas costas. Notou então com surpresa que o homem morto usava as roupas de Kevin. Foi tomado por um medo que nunca havia sentido antes. Sabia oque tinha que fazer, mas tinha medo de descobrir que aquele cadáver descomposto fosse seu pai. Mas tinha que se certificar. Aproximou-se mais e ajoelhou-se ao lado do corpo, o odor de carne apodrecida era insuportável. Prendeu a respiração e com força virou o corpo para si e viu que era mesmo Kevin. Os olhos abertos totalmente brancos, a pele já azulada e ferimento á bala na testa não deixavam duvidas.

       - “Pai. . .” – chorava ao ver seu pai morto.

       - “Filho. . .” – disse Kevin de repente com voz cavernosa.

       Chandler largou o corpo que abraçava, caindo para trás sentado enquanto via Kevin erguer-se e avançar cambaleante em sua direção, enquanto tentava afastar-se daquela criatura ainda sentado e horrorizado.

       - “Olha pra mim, olha o que ele fez comigo.” – disse com uma voz cavernosa.

       - “Não!” – gritou fechando os olhos.

       - “Ele me matou, filho. Ele fez de mim comida para os vermes e isso não é nada legal. . .” – ele continuava, mas ai a voz mudou.

       - “Você se ferrou de vez, pirralho.” – Chandler ouviu uma voz diferente e abriu os olhos, via agora no lugar de seu pai, Robert, o assassino, com um sorriso zombeteiro.

       - “Cala a boca!” – gritou em resposta.

       - “Ah, espere para ver, sua vida vai ser um inferno, e está só começando.” – dizia rindo, mas rindo com vontade.

       Nesse momento Chandler acordou assustado e com uma baita dor de cabeça por causa da coronhada. Olhou em volta. Estava num tipo de contêiner e percebeu que estava em movimento. Talvez estivesse em um caminhão ou algo assim, também havia varias caixas de papelão á sua volta. Notou também e com surpresa que seus pés e suas mãos estavam amarrados com cordas. Ficou desesperado. Arrastou-se até oque poderia ser chamado de parede e começara a socar com força.

       - Ei, abram, me deixem sair! – gritou.

       Mas ninguém ouviria, decidiu parar, ficar quieto, poupar oxigênio em meio às caixas. Não sabia há quanto tempo estava ali desacordado nem quando parariam. Só então começou a entender tudo oque havia acontecido. Seu pai estava morto e ele, indo amarrado rumo a algum lugar desconhecido.

       Robert Murphy, Robert Murphy.

       O nome ecoava em sua cabeça, ele era o causador de todo esse mal. Aquele desgraçado matara seu pai sem piedade. Bem que Kevin havia o avisado que aquela família era do mal. Tiraram a única coisa que ele tinha na vida. Começara a chorar em desespero, isso não podia estar acontecendo. Sentia-se tão culpado agora, porque não se mexera antes? Poderia ter evitado tudo isso, quem sabe? Estava sozinho na vida.

       Neste momento o caminhão parara e as portas foram abertas, Chandler ficou apavorado e antes que percebesse, varias pessoas entravam dentro do contêiner. A luz que entrava fazia aquelas pessoas parecerem sombras e isso não ajudava. Como estava lá no fundo do contêiner, dois deles andaram até ele e o pegaram, arrastando-o para fora. Era de dia, embora o tempo estivesse chuvoso, a luminosidade fez seus olhos arderem. Começava a se molhar com a chuva e vários homens o rodeavam curiosos. Deu uma boa olhada no lugar e viu com espanto que se tratava de um Porto: navios, contêineres, caixas e mais caixas, empilhadeiras e o mar á sua frente. Mas por que raios estava num porto?

       - Olhe só para ele. – um dos homes disse, era moreno, usava um terno bom, destacando-se dos outros que usavam calça jeans rasgadas, e camisas sujas. Destacava-se também pelo sotaque estrangeiro. – É mesmo uma bela mercadoria, meu patrão vai gostar muito.

       - Oque? – Chandler perguntou. – Oque quer dizer?

       Todos os marinheiros que o rodeavam riram dele, não entendera exatamente o porquê, nem a razão de estarem rindo. O que estava acontecendo?

       - Coitadinho, deixa-me explicar: - o homem aproximou-se, abaixou-se e sussurrou em seu ouvido. – vamos fazer uma pequena viagem, você e eu.

       - Como assim?

       - Vai saber quando chegar lá.

       O homem fez um sinal com a cabeça e dois daqueles marinheiros pegaram Chandler pelo braço e o arrastaram até uma caixa de madeira que estava aberta, era grande, e notara que caberia lá dentro.

       - Não! – começara a gritar quando percebeu que iam coloca-lo na caixa.

       Embora o garoto esperneasse, os dois homens eram bem mais fortes do que ele e o colocaram com facilidade na caixa, então viu aquele estrangeiro se aproximar segurando uma sacola.

       - Para o caso de sentir fome. – disse ao jogar uma sacola dentro da caixa, antes de colocarem a tampa e a lacrarem.

       Chandler gritava e se debatia na caixa, inutilmente, porque estavam fazendo isso com ele? Cada vez mais se sentia impotente frente aos acontecimentos não sabia oque estava por vir, tudo oque desejava era que acordasse e visse que isso tudo era um pesadelo.

       Sentiu que a caixa era levantada e que se movia e pôde perceber oque acontecia. Colocaram a caixa em outro contêiner e o embarcaram em um navio que descobriria mais tarde, em direção á Europa.

       Por muito tempo ainda Chandler gritara e debatera-se dentro da caixa de madeira, tanto que ficara exausto e tudo o que conseguira foram seus cotovelos arranhados. Entendera que esse seria seu destino, ninguém iria ajudá-lo, não mais. Seja lá oque fosse acontecer daqui para frente, estaria sozinho e teria de se acostumar com isso. Realmente sua jornada de sofrimento estava apenas começando.

       Chandler não sabia quanto tempo exatamente se passara desde que fora trancado dentro da caixa, pareciam dias. Ele estava com fome, e aquela sacola que aquele estrangeiro jogara continha apenas dois pães velhos. Estava dolorido, estava com sede, e estava sem esperança. E quando achou que eles haviam esquecido ele naquele contêiner, ouvira um som que se assemelhava ao de portas sendo aberta, então a caixa que ele estava foi bruscamente levantada e percebeu que era carregado para fora do contêiner. Era dia, viu pelas frestas os raios do sol. A caixa fora colocada no chão e com golpes bruscos e rápidos a caixa fora aberta.

       O garoto de inicio cobriu os olhos com as mãos por causa da claridade e braços fortes o arrancaram da caixa. Ele ainda estava amarrado e com fome, mal conseguia manter-se em pé, só conseguia ouvir vozes em uma língua diferente. Assim que seus olhos acostumaram com a claridade pôde ver que estava em uma espécie de galpão onde havia vários contêineres e vários homens que o olhavam, inclusive aquele estrangeiro do porto, mas não era esse que lhe chamava a atenção.

       Havia um grupo de homens mais á frente, próximos a uma limusine. Usavam ternos, casacos, fazia muito frio. Notou certas saliências que sabia serem armas. Em sua maioria pareciam capangas, como Ike e os outros lacaios de Robert, todos menos um. Este usava: um casaco, óculos escuros, era moreno como os outros e ao vê-lo lembrou-se imediatamente de seu algoz, pois tinha o ar arrogante e uma presença que os demais pareciam respeitar, e um jeito até intimidador, como gente dessa espécie tem. Não gostou dele logo de cara e para seu desespero estava sendo conduzido até ele. O homem tirou os óculos e revelara um par de olhos de um tom que nunca havia visto antes, um castanho avermelhado muito exótico e profundo. Ele aproximou-se com um sorriso estranho.

       - Bem vindo á Itália. – disse o homem.

       - Itália? – Chandler sussurrou para si mesmo. Não podia estar tão longe assim de casa.

       Olhou em volta, tanta gente diferente, um lugar desconhecido e desconfortável, queria fugir, queria voltar e não tinha como, estava em outro continente. Sentiu-se muito mal, tudo mudara rápido demais para que pudesse assimilar. Enquanto ainda tentava digerir essa notícia, aquele homem começara a rodeá-lo analisando-o com um olhar atento, então se deteve á sua frente e tomara seu rosto numa das mãos.

       - Belo menino. - disse ele – É mesmo muito belo.

       - Quero voltar pra minha casa agora!- protestou afastando-se.

       - Ah, é americano, já tinha me esquecido. – aproximava-se.

       - Quero voltar! – insistia.

       - Mas já? Por quê? Não gosta da Itália? – disse cínico. – Mas antes de continuarmos, permita-me. . .

       Tirou da cintura, do lado das costas, escondido pelo casaco, um punhal. Era de prata, com pedras vermelha incrustradas na base, uma peça linda. Chandler quis afastar-se, mas os brutamontes que o trouxeram o seguravam. O levaram até a Itália para ser morto? Começara a tremer.

       - Está com medo? – riu.

       Aproximou-se mais e então, quando o garoto já se preparava para o ataque o homem inesperadamente pegara suas mãos que estavam amarradas e com rapidez cortara as cordas que o prendiam, repetindo o ato nos pés, deixando Chandler surpreso.

       - Entre no carro. – disse colocando o punhal onde estava antes.

       - Como sabe que eu não vou fugir? – enfrentou.

       - Não vai. – indicou com o dedo os homens atrás dele.

       Engoliu em seco, não tinha escolha. Entrou no banco de trás e aquele homem também. O carro deu a partida e puseram-se a andar pelas ruas de Nápoles. Sentaram-se um de frente para o outro. Chandler não gostava do modo como ele o olhava, como se fosse um presente que havia ganhado, tentava desviar o olhar daqueles olhos avermelhados, mas eram tão penetrantes.

       - Será que agora você pode me explicar o que está acontecendo?

       - Calma, nem ao menos nos conhecemos ainda. - disse educado. – Permita-me, sou Don Giovanni Ballester. – era distinto, refinado e sedutor. – E você?

       - Chandler Desmont. – respondeu rápido.

       - Não há motivo para grosseria, meu caro Desmont. Fez boa viagem?

       - Se você acha passar fome dentro de um caixão desconfortável “boa viagem”, então é, eu fiz uma boa viagem.

       Don Giovanni riu com gosto.

       - Desculpe o transtorno, mas entenda, os policias do porto estão começando a ficar rigorosos em relação á certos tipos de mercadoria importada. . .

       - Eu não sou uma mercadoria. – o interrompeu.

       - Ah, é sim. – Don Giovanni o encarou. – Eu o comprei.

       Chandler ficou paralisado. Robert Murphy o vendera como se fosse um animal, ficou zonzo, isso não estava acontecendo.

       - Isso não é verdade. . . – sussurrou, não queria acreditar.

       - É sim. Agora é meu, caro Desmont, como outros antes de você.

       - Há outros? – perguntou ainda sob o efeito do choque.

       - Tenho vinte garotos que eu comprei, assim como você, meninos e meninas. – dizia calmo vendo a expressão horrorizada de Chandler. – Surpreso? – deu de ombros – Vai se acostumar com a ideia, todos se acostumam, mais cedo ou mais tarde. – a calma dele era incrível. – Até eu.

       - Até você?

       - Sim, eu também fui vendido quando tinha sua idade. – riu – Como vê, o que não mata deixa forte, e é bom não morrer, querido. Pelo menos, não até me dar algum lucro.

       Não acreditava a que ponto chegara. O que seria de sua vida agora? Ficou desesperado, olhou para os lados, estava preso, mais preso do que estava quando estava preso dentro da caixa. Don Giovanni era mais do que perigoso, era poderoso. Fora vendido a um homem que já tinha vinte como ele, começara a chorar desesperadamente com o futuro que se anunciava.

       - Não chore. – tirou do casaco um lenço branco e aproximou-se limpando o rosto do garoto. – Nunca deixe que pensem que pode ser derrubado, demonstre sempre fortaleza, e tudo ficará bem.

       Don Giovanni o olhava com ternura agora e esse foi o primeiro de vários conselhos que ele lhe deu. Naquele momento não pode deixar de aceitar que aquele homem era estranhamente acolhedor, tentando consolá-lo com aquelas palavras. Ele estava certo, já que não havia saída, tentaria ser forte para aguentar o que a vida lhe reservasse. Foi ali, naquele carro, ao ouvir as palavras de se “dono”, que jurou para si mesmo, pelo sangue derramado de seu pai, que um dia iria olhar para o cadáver ensanguentado de Robert Murphy e iria sorrir.

       Depois de terem passado num restaurante (Chandler estava quase desmaiando de fome) a limusine seguiu para o centro da cidade, lugar de casarões enormes, lindos, mas para Chandler não significavam nada, estava meio que entorpecido ainda pela nova realidade. O carro parou em frente a um desses casarões. Era branco, estilo bem antigo, um belo jardim na entrada, uma casa magnífica, cara, pelo visto. Ao saírem do carro, Chandler ficara admirado com a imponência da construção e teve uma ideia da situação financeira de Don Giovanni. Os seguranças abriram os portões e entraram pelo jardim. Já era de noite e era uma visão um tanto sombria estar ali á luz do luar.

       Entraram pela porta principal. O Hall era grande e bem decorado e a sala mais ainda, bem iluminada por um imponente lustre bem no centro. Tinha sofás brancos muito finos, vasos com flores na mesinha de centro e nas estantes. Tinha vários quadros nas paredes. Tinha que admitir: Don Giovanni tinha bom gosto.

       - Frequentemente dou festas aqui, como vê, é uma sala bonita. – disse ele – mas falamos disso depois.

       Os seguranças ficaram na sala enquanto Don Giovanni e Chandler seguiam até uma escada que levava até o segundo andar, juntamente com outro homem que não conhecia. Enquanto subiam, Chandler via na parede várias fotos emolduradas, de homens, mulheres, que pareciam ser amigos de seu dono, em festas em que estiveram, e de crianças, suas crianças compradas. Ao pensar nisso, que logo haveria uma foto sua naquela parede, Chandler sentiu seu estomago embrulhar. O que aconteceria com ele? Não queria nem pensar.

       Chegou ao andar de cima, um corredor com várias portas, o andar dos quartos. Foram caminhando por ele, a ansiedade matando o garoto. Entraram na quarta porta á esquerda. Era um quarto enorme com uma cama de casal com lençóis de tecido fino, móveis de boa qualidade, o armário no canto, o criado mudo ao lado da cama de casal, a escrivaninha, tudo parecia mais antigo que o dono, mas muito bem conservado. Don Giovanni já chegou tirando o casaco pesado, o paletó, jogando-os na cama, afrouxou a gravata. O outro homem permaneceu perto da porta que fechou ao entrar.

       - Este é meu quarto, o que acha? – sentou-se na cama.

       - Porque me trouxe aqui?

       - Para conversar. Sente-se. – deu umas palmadinhas na cama, convidando-o o sentar-se ao seu lado. – Venha. – disse sedutor.

       Como não queria mais problemas aceitou o chamado, ainda meio relutante sentou-se na cama ao lado de Don Giovanni.

       - Sei que não é burro, já deve ter percebido que sou muito rico. Tem ideia do que eu faço para viver? – disse começando á mexer nos cabelos de Chandler.

       - É um criminoso? – disse meio que dando de ombros.

       - Não, eu forneço o que os criminosos precisam. Armas, drogas, tanto faz. Sou influente, posso comprar qualquer coisa, desde as mais raras obras de arte que você viu lá embaixo, até seres humanos, como você. – dizia frio, o que feriu profundamente Chandler.

       - Quanto pagou por mim? - disse com a voz fraca.

       - Não costumo falar disso com minhas crianças. . .

       - Eu não sou a receita federal. – disse ríspido – Embora eu tenha certeza que você não declara esse tipo de bem.

       Don Giovanni espantou-se por um momento com o atrevimento de Chandler, porém com um sorriso disse:

       - Trinta mil dólares americanos.

       Chandler ficara chocado com a resposta. Trinta mil era seu preço afinal.

       - Você foi o meu garoto mais caro. Mas vendo esses olhos verdes que você tem, acho que o investimento valeu a pena. – disse satisfeito pelo bom negócio feito.

       O garoto continuava calado, atordoado com as palavras de Don Giovanni. Robert Murphy havia matado seu pai e ainda ganhara trinta mil vendendo-o. Isso era demais para ele, tudo parecia um terrível pesadelo, queria acordar.

       - Oque foi? – perguntou Don Giovanni, notando o abalo que causara no garoto.

       - Isso não é justo. – sussurrou para si mesmo, mas alto o suficiente para que Don Giovanni ouvisse.

       - O que não é justo?

       - Tudo oque esta acontecendo comigo. – começou a chorar.

       - Ah, você devia viver num mundo tão idealizado, tão superprotegido, quase num sonho. Mas agora é hora de acordar para a realidade, queridinho, aquele mundo bonito das historias que seu pai contava não existe. Ele é feio, é cruel, para se viver nele é difícil, ninguém mais vai ajudar você. É hora de aprender a se virar sozinho e de ser um pouco cruel, como eu. – disse sério. – E a primeira lição é: “não confie em ninguém além se si mesmo.”.

       Ficara em silêncio analisando essas palavras. O mundo era horrível, lembrou-se que tudo isso estava acontecendo por culpa de Robert, aquele filho da mãe.

       De repente Don Giovanni levantara-se e pusera-se a andar pelo quarto.

       - Agora tem o seu presente de boas vindas. É um que dei a cada um dos garotos que comprei. – sorria – Já esteve na Canadá? Claro que não, algumas, partes são tão frias que não se pode andar sem treno, puxado por cães treinados, que tem sua própria hierarquia. De qualquer forma, quando o dono compra um cão novo, ele dá-lhe uma surra daquelas, para que ele saiba quem é o líder, para que não se esqueça de nunca quem manda.

       Chandler começou a tremer, levantou-se devagar da cama, olhava para Don Giovanni com uma expressão assustada.

       - Vicenzo, - dirigiu-se ao homem parado ao lado da porta que havia ficado quieto até agora. – mostra-lhe quem manda. - disse ao homem antes de sair pela porta, deixando os dois sozinhos.