sexta-feira, 7 de junho de 2013

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"Sebastian" - Capitulo V - Mudanças no destino

Parte II
Capitulo V
"Mudanças no Destino"
 

         Sebastian quase não dormira aquela noite, pensando no que aqueles americanos lhe disseram e em todos os problemas que lhe corroíam a mente e quando conseguiu dormir, teve um sono agitado. Quando acordou de manhã não encontrou Eva a seu lado, ressabiado, levantou-se. De repente um sentimento muito desagradável e familiar tomou conta dele, aquele mesmo sentimento que teve quando seu pai, há muito tempo o deixou sozinho na cozinha de sua antiga casa para nunca mais voltar. Um aperto no seu coração que lhe dizia que algo estava terrivelmente errado.

       Saiu do quarto e começou a chamar por Eva sem obter resposta. Foi abrindo a porta de todos os quartos pelos quais passava, procurando-a, detendo-se então na porta do quarto de Angelo. Com cuidado abriu a porta e viu Eva lá, mexendo nos cabelos negros do filho que dormia profundamente e ao ver o marido ela sorriu. Parecia tudo bem, uma cena normal, mas seu coração sabia que havia algo errado.

       - Eva, está tudo bem? – perguntou preocupado entrando no quarto, pois via que a palidez havia voltado e seus olhos tinham olheiras roxas profundas.

       - Está. – respondeu baixinho.

       Ela estava sentada no chão ao lado da cama, com um ar estranho, meio apagado, como se a vida estivesse se esvaindo dela. Mas como? Ela parecia tão bem antes, tão disposta.

       - Angelo está bem?

       - Claro que está. Eu só queria ficar olhando para ele um pouco. – voltou a olhar para o garoto – Ele é tão bonito, espero que também seja feliz.

       - Ele será. – Sebastian não sabia se foi o jeito com que disse, mas isso de repente lhe pareceu uma despedida.

       - Me promete uma coisa? – disse ela de repente em tom muito sério que causou um calafrio em Sebastian.

       - Qualquer coisa. – sua mão suava.

       - Não fique triste. – essa frase foi como um punhal em seu coração.

       - Não ficar triste, por que diz isso?

       - Por que eu não quero que fique triste, quando chegar a minha hora.     

       - Pára com isso Eva. - disse aproximando-se dela e tocando-a, ela estava fria. – Eva, você tá fria. – ele a pegou no colo e com cuidado a levantou e a carregou nos braços através do quarto. - Vou chamar o Doutor Bennett, você vai ficar bem. – já saiam do quarto de Angelo e andavam pelo corredor em direção ao quarto deles.

       - Não. - disse ela em voz baixa. – Não quero. – disse fazendo Sebastian parar ainda com ela nos braços. – É a minha hora, tá tudo bem, sabíamos que esse dia chegaria.

       - Mas Eva. . . – seus olhos estavam marejados, ela não podia estar partindo assim – Não, não pode me deixar assim.

       - Não vou deixar você, eu vou estar sempre aqui. – ela tocou seu peito. Ele chorava copiosamente. Ela respirou fundo. – Eu não estou com medo. – sua feição era realmente de quem estava em paz – Me sinto tão leve. . .

       Foi a ultima coisa que ela disse. Um silêncio mortal pairou naquele corredor em que Sebastian ainda segurava Eva nos braços, ele não conseguia mais ouvir a respiração dela.

       - Eva. . . - Sebastian chamou sem resposta. – Eva. . . – insistiu, sabendo muito bem que não haveria resposta.

       Eva estava morta.

       Caíra de joelhos no chão, com Eva nos braços, chorando desesperado, abraçando-a como se isso pudesse manter seu espirito no corpo. Perdera aquela que amava, seu anjo havia voltado para o Criador.

       Chorava desesperado, a tristeza corroía ele por dentro. Levantou-se cambaleante, deixando Eva deitada no chão daquele corredor. Estava perdido, zonzo pelo impacto acontecido. Ouviu então passos subindo a escada e viu Luigi e Pietro vindo em sua direção. Eles tinham vindo, como sempre, para irem juntos para o vinhedo e tinham ouvido o choro desesperado de Sebastian lá da sala e subiram correndo aflitos e se depararam com essa cena: Sebastian chorando desesperado andando para lá e para cá e Eva no chão.

       - Ela morreu. . . - disse com dificuldade caindo de joelhos no chão outra vez – Ela morreu. . .

       Os irmãos se entreolharam chocados e se aproximaram dele. Luigi abraçou Sebastian e com a cabeça fez sinal para que Pietro verificasse se Eva estava mesmo morta, enquanto ele o levantava do chão e caminhava com ele para o quarto do casal.

       - Ela se foi, Luigi. . . – soluçava enquanto o irmão o abraçava tentando acalmá-lo.

       - Sebastian. . . eu. . .

       Logo depois, Pietro apareceu na porta do quarto e com a cabeça fez um sinal afirmativo, confirmando a triste realidade.

       - Eu sinto muito, Sebastian. – disse Luigi ao mesmo tempo em que o irmão se aproximava e colocava a mão no ombro de Sebastian, num gesto terno. Nunca mais nada seria o mesmo

 

       Dois meses haviam se passado desde a morte de Eva e nesse tempo, os gêmeos notavam um ar perturbador em Sebastian. Um ar meio desligado, meio sonâmbulo, estranho, como era aquele rapaz que Eva havia encontrado na frente de certa lanchonete, anos atrás. E naquele dia em especial esse ar desligado estava pior do que antes, pois o testamento de Eva havia sido lido naquela manhã, revelando Sebastian e Angelo sendo os herdeiros de uma grande fortuna. Eva era rica, isso se sabia, boa parte de seu dinheiro era fruto de seu próprio trabalho, em anos á frente do vinhedo. A outra parte, bem maior, era o que havia herdado de seus pais. Nunca soube o que fazer com tanto dinheiro, por isso deixou o parado em uma conta. Agora, inesperadamente Sebastian e Angelo eram milionários. Angelo não sabia ainda que sua mãe havia morrido. Como a criança de quatro anos que era, achava que Eva estava em alguma viagem misteriosa e com essa versão da historia ele ficaria até que tivesse idade para entender oque acontecera.

        Os irmãos Tomazi resolveram passar um tempo no casarão, para ajudar Sebastian a cuidar de Angelo e para animar o amigo que parecia estar entrando em depressão.

       Sebastian estava sentado num banco de madeira antiga mas boa, na varanda do casarão, sozinho, enrolado num cobertor. Aquele era um dia frio, afinal estavam no final do outono, logo chegaria o inverno e ventava muito por aqueles lados. Estava quieto, apenas olhando para o nada, pensando em varias coisas. Isso não era justo! Será que nunca seria feliz? Será que todas as pessoas que amava tinham que acabar sete palmos abaixo da terra? Não era justo!

       Os irmãos, juntamente com a babá de Angelo, observavam-no do lado de dentro através da janela de vidro da sala.

       - Ele está lá desde que o tabelião foi embora. – comentou a babá Sophia – Já fui lá duas vezes para perguntar se ele queria alguma coisa e ele só me ignorou, continuou calado, olhando pro nada. – seguiu-se um silêncio – Será que ele está bem?

       - É o que vamos descobrir. – Luigi disse caminhando através da sala em direção á porta, chamando a atenção de Pietro.

       - Ei, Luigi! – Pietro correu até ele, segurando-o pelo braço, interrompendo-o. – O que está fazendo?

       - Vou ver o que ele tem. – disse naturalmente confuso com a atitude do irmão.

       - Não parou para pensar que talvez ele precise de um momento sozinho? Dá uma folga, ele só está triste.

       - Você não reparou na cara dele? É a mesma cara que ele tinha quando. . .  – hesitou – E se ele estiver pensando em voltar a usar aquelas porcarias? E se já estiver usando?

       - Nós não conseguimos fazê-lo parar naquela época, o que o leva a pensar que conseguiríamos agora? – Pietro objetou.

       - Poderíamos tentar pelo menos. – disse sério – Agora ele tem uma vida, um filho, um futuro pela frente. Antes ele não tinha nada disso. – revoltava-se – Em respeito á memoria de Eva, não vou deixar que todo o trabalho que ela teve para endireitar esse filho da mãe vá pelo ralo. – afastou-se e ia em direção á porta outra vez.

       - Em respeito á memoria de Eva, vá mais devagar, irmão.  – Pietro jogou a indireta venenosa – Ainda estamos de luto, lembra?

       - O que? – virou-se ao ouvir a apunhalada – Se tem algo para dizer, irmão, diga logo. Eu estou farto das suas indiretas. – aproximou-se com ar visivelmente irritado.

       - Sabe muito bem oque eu quis dizer. – disse com sarcasmo, provocando-o.

       E Luigi realmente sabia, e isso lhe doía, no coração. Essa era sua única fraqueza e era triste ver que seu irmão o provocava desse jeito.

       - Eu tenho sim respeito por Eva, eu a admirava. Foi por causa dela que deixamos aquela vida horrível, e você sabe que eu nunca. . .  – hesitou – Ele é meu amigo.

       - Mas bem que você queria que isso fosse diferente. – Pietro disse direto dessa vez. – Acorda Luigi, isso não vai acontecer.

        Luigi lançou lhe um olhar de surpresa e desapontamento tão forte que fez Pietro se arrepender do que disse.

       - Vou fingir que você não disse isso. – disse sério e com a voz pesada – Tenho que cuidar de um amigo agora.

       Virou-se, respirou fundo para se controlar depois dessa conversa e voltou a caminhar na direção da porta de vidro da varanda. Pietro sentiu-se mal por ter dito aquelas coisas. Isso era um assunto apenas de Luigi, historia antiga, que não lhe dizia respeito. Odiava discutir com o irmão, então o seguiu.

       Do lado de fora os rapazes foram surpreendidos por um vento gelado, arrepiando lhes os pelinhos dos braços pois estavam só de camiseta. Devagar e com cuidado, aproximaram-se do banco em que Sebastian estava sentado, jazendo quieto como uma pedra.

       - Sebastian, - começou Luigi – vamos entrar, está frio, vai acabar pegando uma gripe se ficar aqui pegando esse vento. – o amigo continuava absorto em seus pensamentos.

       Ao ver que a coisa era realmente seria, Luigi sentou-se ao seu lado no banco.

       - Como você está? – ele perguntou colocando a mão em seu ombro.

       - Como acha que eu estou? – respondeu ríspido depois de tanto silêncio, deixando Luigi intimamente alegre por ter arrancado alguma reação do amigo, bruta que fosse.

       - Sebastian, você não pode deixar se abater assim. – tentava animá-lo. – Angelo ainda tem o pai, ele precisa de você. E você tem seus irmãos aqui, pode desabafar.

       Seguiu-se um momento de silêncio sepulcral entre os três naquela tarde fria. Sebastian parecia estar decidindo se ia falar ou não, deixando-os apreensivos, mas por fim respirou fundo e começou, sem ao menos levantar a cabeça para encará-los.

       - Eu fiquei aqui, esse tempo todo, pensando em tudo o que me aconteceu. – disse serio – Uma vez eu disse para Eva que nós mesmos fazíamos o nosso final. Ela por outro lado acreditava em destino, Deus, ou qualquer outro nome que queiram dar a isso. Sabem o que ele é? Eu vou dizer, não passa de uma criança sádica brincando com a gente como se fossemos soldadinhos de chumbo.  E eu estou cansado de esperar que ele se canse de mim ou que ele me faça justiça, enquanto arranca de mim as pessoas que eu amo.

       - Do que está falando? – Pietro perguntou desconfiado.

       - Eu tentei, eu juro que tentei não me perder, mas parecia sempre que tinha alguma coisa me puxando á isso. Eu lutei, tentei ser bom, talvez assim coisas boas viessem, mas não tem jeito. Parece que quanto mais eu tento me afastar dessa caminho, mais o destino me chuta. Ele quer que eu jogue o joguinho dele? Então eu vou jogar.

       - Como assim?

       - Robert Murphy. – disse por entre os dentes.

       Os irmãos se entreolharam assustados, conheciam a história de Sebastian e sabiam mais ainda que ele nunca tocava no nome dele daquele jeito, nem nos seus piores dias.

       - Eu prometi ao destino que voltaria a encontra-lo. Está na hora de cumprir minha promessa. – disse com sarcasmo.

       - Sebastian, você não tinha desistido desse historia de vingança? – Luigi perguntou olhando desconfiado para Pietro.

       - Tinha. – ele respondeu meio disperso - Ela que não desiste de mim. Vou voltar para minha terra, vou encontra-lo e vou fazer justiça. – disse determinado – Mas preciso da ajuda de vocês dois. – disse virando-se e encarando os irmãos – Me ajudarão?

       - Sim. – Pietro disse sem pensar. – é claro que vamos com você, irmão.

       - Mais do que ninguém a gente sabe o quanto você sofreu por causa dele. – disse Luigi serio. – Você tem certeza que é isso mesmo que quer? Uma vez começado, não tem volta.

       - Tenho. – disse enfático.

       - Então eu vou. – disse Luigi. – Mas o que tem em mente?

       - Vou destruí-lo. – disse muito calmo. – Quero que ele sofra. Quero que ele saiba o que “desespero” significa. Ele vai pagar por cada lagrima derramada, por cada noite não dormida, por cada gota de sangue que derramou do meu pai. Vou acabar com ele, e não vou ter piedade.

      Ele nunca o tinha visto assim com tanto ódio a sede de vingança cegando-o. Demonstrava uma parte dele que nunca tinha visto, diabolicamente astuta, perigosa, mas não lhe tiravam a razão. Sebastian era seu amigo, seu irmão, na época das ruas ele o ajudara de varias formas, pelas quais era grato até hoje. Não negaria esse favor ao amigo, pois sabia que faria o mesmo se os papéis se invertessem.

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